quinta-feira, 26 de março de 2015

Sempre o dia nasce após a noite


As manhãs nascem leves, frescas e com tons por definir, é preciso agasalho para caminhar na rua nas primeiras horas do dia. Nestes momentos de meio termo entre a noite escura e o dia pleno, não há sons do quotidiano, há o silêncio do vento a bater nas folhas das árvores altas e magras, a saudade crescente do calor do lar e a esperança de um decorrer de dia sereno, sem preocupações que nos agitem a alma ou nos faça chorar o coração. 
Os dias passam lentos, embora pensemos que correm velozes, porque as horas são vazias e o seu tempo preenchido. O relógio marca a passagem de semente, a planta débil, a planta vigorosa que dá flor, e mais tarde fruto, e quem o come tem os cabelos brancos a crescerem-lhe na cabeça. Que má sorte a que nos faz nascer para morrer e não morrer para nascer! Alguém vela por nós, porém, para que descansemos sem temores e despertemos para a luz e não para as trevas. Ouvi também promessas de que o Seu Paraíso não é pequeno e que as luzes não permitem sombras e deixam ver claramente, mesmo quando se fecham os olhos, que só vêem o aparente, pois a alma torna-se a visão dos cegos e a alegria dos miseráveis. E enquanto cá estamos, turistas da própria vida, somos surdos e insensíveis a tudo quanto não nos afecta directamente. Mas, Senhor, queremos ver-Te com definição no sorriso desdentado das crianças, e no postiço dos idosos, ouvir-Te no cantar simples dos pássaros, cheirar-Te nos campos repletos de flores que crescem espontaneamente, sentir-Te no pêlo macio dos cães, saber-Te o gosto no pão que partilhamos na Eucaristia, inteirarmo-nos de Ti, da tua branda doçura. Aproxima-Te, abre os Teus braços e deixa-nos cientes disso, para que mesmo caindo possamos chegar até ao Teu abraço. Porque sabemos de Ti, no entanto não Te vemos na nossa busca incessante e a nossa vigília é em vão. Retira, Deus nosso, as sombras do nosso coração, as névoas dos nossos olhos e os freios das nossas mãos, para que estejas presente em tudo e para que tudo sejas Tu. 
Pois, quando a noite cai gentilmente sobre os campos e as casas da povoação, mudando a cor do céu gradualmente, o frio que passa pelas frestas das portas arrefece-nos e dá-nos vontade máxima de nos deixarmos cair sobre o leito quente e reconfortante, todavia a realidade não desaparece. A noite é o tempo de preparação para o que virá no amanhã e esse porvir com as suas esperanças é Ele, que nos oferece o renascer, em cada dia após a noite.

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