segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Passado?



A luz matutina brincava no seu rosto. Não tivera sono tranquilo. Antes, voltou a ser aterrorizada pelos sonhos com túneis escuros, gritos angustiados e o aluvião arrastando-a implacavelmente para as profundezas, enquanto a dor e o medo de morrer afogada a atormentava. Levantou-se e julgou ouvir o canto do galo de pescoço careca. Aguçou o ouvido e não ouviu mais nada além do trinar das aves. Apreciava esse canto mas não reconhecia o lugar onde estava. À sua volta, um quarto desconhecido. O reflexo no espelho da penteadeira, este delineava alguém, na qual não se reconhecia. Tocou o rosto sonolenta como para se descobrir na imagem que o espelho reflectia, mecanicamente dirigiu-se à casa de banho que também lhe pareceu estranha e diferente do habitual, cuidou de lavar os olhos e pentear os cabelos. Continuava a não se reconhecer, voltou ao quarto e atirou-se para a cama incapaz de compreender ou enfrentar o pesadelo que vivia. Com um assomo de coragem voltou a olhar-se ao espelho e voltou a não se reconhecer no que via, ou melhor no que o espelho reflectia, atónita via que era a sua imagem vinte anos antes que os seus olhos encontravam, só podia estar a viver um pesadelo, olhou à sua volta e tudo o que via retratava a sua vida já há muito tempo passada, lentamente foi reconhecendo que o quarto, era o seu quarto de solteira, a cama, a penteadeira, os posters nas paredes, (como a sua mãe se zangava com isso) tudo pertencia ao passado, esfregou mais uma vez os olhos numa tentativa mais de sair do tormento, nada mudava sentia que estava a enlouquecer. Lentamente vestiu o robe e iniciou a descida da escadaria de acesso ao hall principal, desejando que o movimento a fizesse despertar para a realidade, enquanto descia cada vez mais o passado estava presente, quando atingiu o patamar que a escada fazia, a sua mãe apareceu no fundo e gritou:
 - Ainda estás assim? Ó tempo que o Marco espera por ti.
Abriu desmesuradamente os olhos o espanto atravessou todo o seu ser, à sua frente a imagem da sua mãe tal com há vinte anos, subitamente ao lado apareceu Marco, seu marido que olhando para ela perplexo observou:
- Então que se passa, esqueceste que combinamos ir almoçar à quinta onde vai ser o jantar do nosso casamento?
Deu um grito angustiado e caiu desamparada ao chão.

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